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Resenha ” Quem matou Oripão? Diamantes, Política, Festa e Morte!

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Gente boa do Blog, recebi no final do ano passado, de um colega professor amigo meu da Unversidade Estadual de Goiás (UEG) uma resenha do livro recém lançado por mim: Quem matou Oripão? Diamantes, Política, Festa e Morte!
Compartilho ela aqui com vocês leitores, ele é do norte goiano, nunca havia lido ou ouvido sobre a história do crime e sua escrita é a partir da leitura do livro.
Obrigado professor Adelino Machado pela leitura, pela escrita, por ter compartilhado comigo suas observações.
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Imagem: Capa do livro Quem Matou Oripão?
LEÃO, E. Mamede. Quem Matou Oripão? Diamantes, Política, Festas e Morte!
A primeira impressão que se tem, ao ler o título, ler a capa deste livro, que me foi presenteado pelo próprio autor em uma reunião do Conselho Universitário – CsU, da UEG, na cidade de Anápolis, no dia 05 de setembro de 2019, é que o professor Mamede parece indicar um conjunto de “sujeitos”, (substantivos), quais sejam os Diamantes, a Política, e as Festas, para responder uma pergunta: Quem Matou Oripão?
Oripão é Eurípedes Pereira Ferreira, ex-prefeito de Catalão – GO, assassinado em agosto de 1998. Ao iniciar a leitura percebe-se que os diamantes e as festas margeiam o pensamento do autor e a Política (partidária) está no centro, o sujeito “política” é colocado nesta posição, talvez inconsciente por parte dele, mas a conclusão da leitura possibilita sentir que os demais sujeitos (diamantes e festas) circulam em torno do ato (do núcleo “do átomo”), para metaforizar o sentido lido, no romance policial de um professor muito corajoso.
O livro projeta luzes na máxima popular de que “não existe crime perfeito”. A verdade é que boa parte dos crimes são perfeitos, ainda mais quando se passam muito tempo de sua ocorrência. Talvez se pudesse afirmar, que com o tempo os crimes vão se tornando perfeitos. Aliás, o tempo é um recurso que alguns entrevistados pelo professor utilizam para dizer que não se lembram dos fatos, e que por esse e outros motivos preferem “não querer” aprofundar no assunto.
O crime, que ao ler o livro ouso chamar de a “misteriosa” morte do prefeito de Catalão, faz parte da coleção de crimes sem solução, ocorridos em nosso país, sempre observada à prática de outros crimes, para ocultar o primeiro. Coloco o mistério entre aspas, por se tratar de um crime realizado “à luz do dia”, onde boa parte das investigações mais pareceram estratégias, exatamente para dificultar a elucidação da trama.
Então inicio pelo que bem relata o professor Mamede, sobre o surgimento do “Rei do Lago”! Pois bem, essa história de um sujeito se tornar rei quando há interesses políticos, que se ligam diretamente ao poder econômico, geralmente tende a não florescer. Isso porque o
1 Adelino Machado, professor e diretor da UEG Campus Campos Belos. Leitura finalizada no dia 26 de dezembro de 2019, nos primeiros dias de verão, na cidade de Palmas, Tocantins, às 11 horas e sete minutos.
dinheiro, que alimenta o poder no sistema capitalista, se locupleta na anti-razão e utiliza-se da violência, policial ou não, para garantir sua predominância. Basta lembrar-se do “Rei do Cangaço”, do “Rei do Tráfico de Drogas”, etc. Ou seja, quando os “reinados” ameaçam o poder imperioso do Estado Capitalista, todo o aparato é utilizado para aniquilá-los.
O “Rei do Lago” foi sendo forjado (p. 49), a partir de muitos negócios, que vão desde a figura de um “capangueiro”, sujeito atravessador de pedras preciosas em garimpos, a um empresário de sucesso que passou a frequentar as rodas sociais mais endinheiradas da região de Catalão, uma das mais ricas de Goiás, em se tratando de desenvolvimento econômico- financeiro de exploração, principalmente por meio do Agronegócio.
No Brasil e em qualquer país de capitalismo atrasado, não é difícil tornar “rei”! Existe rei de quase tudo. Mas esses reinados, nesses contextos, não podem atingir a essência do poder. Se isso ocorrer, isto é, se ameaçar os poderes das classes que dominam os meios de produção (indústria, comércio, ou fundiária), a tendência é ter duração curta. Do outro lado, se o “reinado” vier a colaborar, principalmente como anestésico para a massa, como é o caso do “rei da música”, ao contrário, sua vida tende a ser longa, pois consequentemente, direta e indiretamente reforça o sistema de injustiça, do qual sobrevive o capital.
No caso de Eurípedes Pereira, o “Rei do Lago” a opinião deste leitor, após apreciação do livro é a de que ele, em seu “reinado”, tentou “servir a dois senhores2”. Ao mesmo tempo em que construiu Casa de Apoio e distribuiu dinheiro e comida aos pobres, (p. 55), fez diversas concessões aos ricos, como utilizar as máquinas da prefeitura para colaborar com a instalação de uma grande empresa na cidade, bem como fez conchavo com alguns endinheirados para chegar ao poder.
Entre um senhor e outro, Eurípedes bateu de frente com poderosos, já instalados e radicalizados no poder, gente que não abre mão de controlar as riquezas naturais dos municípios brasileiros. Seu estilo de governar não agradou a boa parte daqueles que fazem somente um interstício no poder. Então foi necessário que uma turma criasse condições e justificativas para que esse prefeito fosse barrado e banido para sempre. E seu estilo passional, popular e informal de tratar de questões de Estado, trazido do garimpo, lhe pôs as vendas necessárias, o que facilitou a orquestração de seu assassinato.
 Metáfora bíblica para simbolizar alguém que serve a Deus e o Diabo ao mesmo tempo.
Percebe-se na leitura do livro, que “Quem matou Oripão” assistiu de camarote o tempo passar, seu desaparecimento ser transformado num espetáculo de acusações e especulações, as quais só contribuíram para tornar a morte misteriosa, portanto insolúvel. O inquérito policial nada mais se tornou, que um rol de falsos testemunhos manipulados, manchados pela corrupção de agentes públicos. Quaisquer sinais de seriedade nas referidas investigações acabaram sendo atacadas com a troca de pessoas de comando, para que o desvende se tornasse cada dia mais complexo e fossem afastadas as pressões internas e externas na direção do encontro do, ou dos verdadeiros criminosos.
Mesmo sendo leigo, não é difícil entender que quando há assassinato de pessoa que haja algum indício de morte encomendada, a primeira pergunta e o início das investigações se dão pelos caminhos de quem possivelmente interessaria no ato, no desaparecimento da vítima. Nesse caso a investigação se concentrou exatamente ao contrário, naqueles que não tinham nenhum interesse, pois os garimpeiros eram ligados e beneficiados, tanto na venda de seus produtos, quanto na manutenção da relação pessoal, que lhes traziam muito mais benefícios do que prejuízos.
Se o “sujeito” Política Partidária é o centro da resposta, e não poderia ser diferente, porque Oripão foi acima de tudo um agente político e ele não seria, ou não teria nenhuma visibilidade se assim não o fosse. Chama muito a atenção, o fato seus auxiliares, particularmente os do primeiro escalão da prefeitura e vereadores não terem sido investigados, de os telefones dos que mantinham negócios em tornos das verbas e cargos, bem como sua vice, não terem tido quebrados seus sigilos, principalmente telefônicos. São procedimentos básicos realizados numa investigação desta envergadura.
Ao finalizar a leitura do livro, nesta data, às 11 horas e sete minutos passei a comentar com minha enteada Letícia. Eu disse a ela que estava intrigado porque tudo indicou que foram presas, torturadas e condenadas pessoas, que em minha opinião, não cometeram o crime.
Disse também que vi e senti toda a força do dinheiro que intermedia o controle do poder entre os agentes políticos partidários. Então ela reagiu naturalmente: “isso parece coisa de vice- prefeito que manda matar o prefeito para ficar no cargo”. Apesar de já ser uma leitora em potencial, esse livro ela ainda não leu!
Em uma corajosa aventura pelo mundo das entrevistas, o autor falou com um assessor jurídico da câmara e da prefeitura, portanto pessoa conhecedora e ao mesmo tempo partícipe da administração municipal. Esse advogado afirmou que presenciou por várias vezes, um dos secretários dizer com irritação “que Eurípedes precisava desocupar a prefeitura!” (p. 184). Tratou-se de seu secretário de saúde, que também é o esposo da vice-prefeita do então mandato de Oripão.
Das vinte entrevistas realizadas ao redor do caso, (correligionários, adversários políticos, autoridades judiciais, empresários entre outros), apenas uma pessoa entrevistada apontou alguma suspeita de envolvimento dos garimpeiros.
E somente uma delas fez referência a boatos espalhados sobre comportamentos pessoais da vítima que possivelmente o levaria a ser assassinado passionalmente. Os demais, dezoito entrevistados, todos foram categóricos em desconfiar, sendo que muitos afirmaram com convicção, que esse crime teve motivações político-partidárias.
Porque os garimpeiros? Porque garimpeiros foram presos e torturados? Porque os garimpeiros que evidentemente gostam garimpar, não levaram nada após o assassinato, mesmo que o prefeito trazia em seu pescoço um belo e valioso cordão de ouro? Porque os garimpeiros que foram apresentados como assassinos seriam tão cruéis com aquele que lhes davam comida e comprava seus garimpados?
Após a barbaridade, a família do prefeito passou a ser ameaçada a ponto de se esquivar a dar entrevista ou tocar no caso dos motivos da morte de seu ente querido. Enquanto os garimpeiros sequer tinham relações pessoais ou algum tipo de contato, ou interesse que o caso não fosse desvendado, até porque eles são pessoas avulsas umas das outras; não são pessoas fixas da cidade de Catalão. Ou seja, mesmo se tivessem sido os autores, como “pessoas de fora” teriam dificuldade de trabalhar pela eterna invisibilidade do crime.
Diz o livro na sua conclusão, que dias antes do ocorrido o prefeito teve desaparecido um molho de chaves (p.261). Essas viriam a ser utilizadas para abrirem as portas de sua própria casa? Quem poderia ter surrupiado esse molho de chaves, se não alguém que vivia em sua proximidade, com acesso a gavetas, armários, etc.? Não havendo respostas, essas chaves serviriam para abrir caminhos para fuga dos criminosos, ou abrir as portas céu, ou do inferno para a entrada de Oripão?
Após tantas perguntas sem respostas, uma delas fica claramente respondida no livro: com a prisão dos garimpeiros ficou aliviada a barra do ou dos verdadeiros assassinos e tudo continuou como o desejado e o planejado. A prefeitura foi definitivamente desocupada, para quem quer que fosse mais interessado. Eurípedes foi entregue para um dos seus senhores e desaparecido pelo outro, o mais poderosos deles.
Hoje, vinte e um anos depois (1998-2019) restaram: a coragem de um Professor de História incomodado com essa história; das aventuras do “Rei do Lago” a lenda do Oripão, “pai dos pobres” e uma região mais desenvolvida pelo turismo. Das investigações restaram interrogações e incertezas. No mais restou um excelente romance policial, digno de ser transformado em filme, para gerar curiosidade e quiçá incentivar novas gerações a não repetir o feito dessa forma, ou ainda estudar melhor a cabeça dos donos do poder econômico de Catalão ou de qualquer outro município brasileiro.
Palmas, TO, 26 de dezembro de 2019, 15h: 53min.